14/07/2016
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Eu Mãe/
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Depoimento “Eu, Mãe”.
Vanessa Pinheiro Fontes: 34 anos, assessora de imprensa, mãe de uma menina de três anos
“Você se livra desta merda e eu te dou um sobrinho antes da hora”.
Esse foi o trato que eu fiz com a minha cunhada quando ela se tratava de uma leucemia, em 2011. Em 2009 meu pai havia enfartado e eu costumo dizer que ele praticamente fez uma obra viária no coração. Assim, com esses dois choques eu, que planejava ser mãe por volta dos 35 anos, resolvi engravidar antes.
A gente queria compartilhar a alegria de uma nova pessoa na família.
Minha cunhada ficou três meses internada e quase morreu. Mas conseguiu se curar apenas com a quimioterapia, sem precisar de um transplante.
Ela fez a parte dela no trato. E eu fiz a minha.
Eu e meu marido começamos a tentar engravidar no final de 2011, e até conseguirmos demorou um pouco. Com o tempo as coisas ficaram esquisitas, porque tentar se tornou uma coisa meio mecânica. Pra relaxar, decidimos marcar férias, mas antes de embarcar eu descobri que finalmente havíamos conseguido.
Assim que o resultado deu positivo, me bateu um pânico em relação ao trabalho, e antes de contar pra minha família toda contei pra minha cunhada, que naquela época já estava em remissão.
Mesmo grávida, eu e meu marido fomos viajar. A gente foi pra Europa, e levei um grande susto na República Tcheca: levei um tombo no Castelo de Praga. Só relaxei quando voltei ao Brasil, fiz um ultrassom e ouvi o coração da minha filha.
Durante a minha gravidez eu não sofri, não enjoei, mas tive azia e pressão alta no final. Nos últimos dias eu já não aguentava mais e o trabalho foi se tornando cada vez mais difícil.
Fica grávida é legal, mas aquela barriga pesava demais e eu me incomodava sem saber o que estava rolando ali dentro, sabe?
A minha filha mudou a minha vida. Mudou o meu jeito de ver as coisas. Ao saber que eu seria mãe de uma menina eu decidi que eu iria criar uma mulher forte.
A minha filha nunca usou rosa, e princesa por aqui só a Léia. Durante a gestação eu avisei que roupas dessa cor seriam doadas e eu me irritava muito quando ia a uma loja, pedia roupas de várias cores e quando eu dizia que era menina quem estava me atendendo ignorava o meu pedido de não me trazer nada rosa.
- Ué, mas não é menina?
A filha é minha e eu decidi fazer o que eu bem entender.
Ela já sabe que ser diferente é legal. Gosta de brincar de mamãe e é apaixonada por crianças menores do que ela. Ela brinca de bola, joga videogame e anda de skate.
Eu nunca fui lá muito tradicional, apesar dos meus pais serem. Eu nunca fui oficialmente casada, e eu confesso que a chegada da minha filha me fez, definitivamente, tocar o foda-se.
O meu pai era funcionário de uma mineradora e por isso eu morei em muitos lugares diferentes durante a minha infância. Eu convivia com realidades diferentes e isso deu a mim e ao meu irmão uma visão de vida muito alternativa.
Nos lugares que a gente morava, o filho do diretor da mineradora estudava na mesma classe do filho do funcionário mais básico. E por isso eu quero que a minha filha lide com todo mundo de forma igual.
O maior problema em me tornar mãe foi voltar a trabalhar.
Eu adorava ficar com a minha filha mas eu sentia falta de falar com outras pessoas sobre outras coisas. Mesmo assim, um mês antes de voltar ao trabalho eu comecei a surtar.
O dia em que eu deixei a minha filha pela primeira vez na escola eu parecia a Carolina Dieckmann naquela cena da novela em que ela perde o cabelo. Eu chorei daquele jeito do berçário até chegar na porta do trabalho.
Na volta ao trabalho, eu tive que brigar pra ter de volta clientes que eu tinha antes, que gostavam de mim e eu deles e que foram para outras pessoas. Eu falei para o meu chefe que ele estava me forçando a pedir demissão. Por causa disso, desse stress todo, eu digo que o primeiro ano da minha filha foi o melhor e o pior da minha vida.
Essa luta diária que a minha vida havia se transformado estava me enchendo, esgotando as minhas energias. Assim, eu liguei para um amigo que havia aberto uma assessoria de imprensa na área de cultura. A gente já se conhecia, já falava em trabalhar junto há muito tempo mas até então não tinha rolado.
E rolou naquela hora. Eu ganharia 50% a menos do que meu atual salário e trabalharia em casa.
Eu faria muito mais diferença na vida da minha filha do que na vida da empresa. Eu estava perdendo coisas importantes, eu me doava por algo que não gerava nenhum reconhecimento. Meus clientes me adoravam mas meu chefe só me dava avaliações negativas. Eu tinha que provar a minha competência todos os dias. E também todos os dias eu perdia quatro horas no trânsito. Quatro horas em que eu poderia estar com a minha filha.
Então eu coloquei um ponto final nisso tudo.
Voltei de férias e pedi demissão.
Logo depois disso meu marido, que segurou a onda durante todo esse tempo, foi promovido. Ou seja, aconteceu tudo na hora certa.
A minha filha acorda na hora que ela quer, passamos muito tempo juntas, consigo acompanhar a rotina na escola, eu participo da vida dela. Como sou assessora de imprensa na área de cultura, eu saio bastante à noite para acompanhar estreias, mas é isso. Ela faz tudo no tempo dela.
Mas como feminista é um pouco difícil pra mim ver o homem pagar a conta. Apesar disso, meu marido fica feliz em poder proporcionar isso a nós duas: tempo. Convívio.
E eu não troco isso por absolutamente nada.
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